Jesus disse que aquele que desejar ser Seu discípulo, deve negar a si mesmo.

O “si mesmo” ao qual Jesus se refere não é o eu puro; é o eu fetichizado; é o eu morto, porém, existente como pulsão psíquica sem a volição do espírito.

Segundo Paulo, talvez ecoando o “deixa os mortos enterrarem seu mortos...” de Jesus — o espírito está morto a menos que seja vitalizado pela percepção do amor de Deus.

“Ele vos deu vida estando vós mortos em delitos e pecados”.

Na realidade a afirmação de Jesus sobre os vivos-mortos e a de Paulo sobre todos nós estarmos mortos, apesar de existentes, até que a Vida de Deus se manifeste em nós, é um conceito assustador para muitos.

Assustador, porém, verdadeiro.

Existe algo pulsante em nós que é existência psicológica, ou almática, conforme Paulo diz ao referir-se ao Homem Psíquico ou Natural.

Até que o Evangelho avive o ser [o eu profundo], o que existe em nós é alma em pulsão, por vezes controlada pela razão, mas, ainda assim, alma em pulsão.

Jung identificou o Self como sendo o principio regulador da atividade psíquica. Uma espécie de Sol da alma, da psique.

Em Jesus, o “si mesmo” não é o Self de Jung, mas é aquilo que Jung não viu no Self. Ou seja: Jung trata o Self como se ele fosse o espírito, mas, de fato, o Self ainda não é o espírito.

Na realidade o “si mesmo” é o eixo do eu iludido; é o sol do eu sem forma e vazio de Eu, embora cheio de suas imitações.

Para Jesus o “si mesmo” faz guerra contra o eu puro e vivente em espírito e em verdade.

Não existe a morte do eu em Jesus. Existe a morte do “si mesmo”.

O “si mesmo” é o eu sem caminho para fora de si!

O “si mesmo” é o eu sem o olhar da vida e da disposição de transcender ao imediato.

O “si mesmo” é o culto do eu adoecido ao que lhe seja razão imediata.

O “si mesmo” também é formado pelo conjunto de influencias do eu partido, dividido, conforme Paulo em Romanos Sete, mais as construções do curso deste mundo e das ilusões vendidas como paixões da carne.

O “si mesmo” se justifica a si mesmo com o argumento de que as coisas são como as coisas são.

O si mesmo assim vira “carma” para o eu!

Jesus, porém, diz que ninguém se torna Seu discípulo enquanto cultua o si mesmo.

O “si mesmo”, por essa razão, tem que ser negado até que morra...

Para que por ventura não façais o que seja do vosso querer”; diz Paulo.

Hoje em dia os discípulos da “igreja” e de suas teologias prevalentes são todos discípulos do “si mesmo”.

Afinal, o que são as teologias da prosperidade, dos carros, das roupas, das casas, das empresas, das viagens, dos bens, das posses, das reputações, dos poderes e influencias — além do si mesmo assentado no seu trono no centro da alma sem vida no espírito?

Portanto, não é uma questão de “implicância” minha com tais coisas, como se não bastasse o fato de que elas negam Jesus e o Evangelho. Não. Minha revolta é porque é mentira contra Jesus e o Evangelho.

Além disso, tal equivoco também gera uma prática que perverte tudo, e que jamais fará aparecer um discípulo de Jesus.

Sem negar o “si mesmo” ninguém é discípulo de Jesus; ninguém.

No curso da vida também verifiquei que a maior parte do que se chama de “meu ministério” nada mais é do que a institucionalização do “si mesmo” como missão do ego doente de morte pela vaidade dos próprios pensamentos.

A “igreja” sem Cruz assim convida as pessoas em nome de “um certo Jesus” que nunca conheci:

“Se alguém quer vir à minha frente, a si mesmo se afirme, tome suas palavras mágicas de ordem e confissão positiva, e faça muito sucesso; pois, não vos chamei para serdes cauda, nem de Deus, mas sim cabeça; e até mesmo serdes a cabeça de Deus no mundo; que existe para ser saqueado por todo aquele que for meu discípulo”.

Portanto, a “igreja” sem Cruz não faz discípulos de Jesus, mas de “um certo Jesus”, que não é o dos evangelhos, e que faz discípulos conforme o mundo, conforme o século, conforme a morte e vaidade do si mesmo.

Nele, que nos chama para negarmos o “si mesmo” e construirmos o eu real pelo levar da Cruz,

Caio